CHICO SANTEIRO – ESCULTOR POPULAR SANTOANTONIENSE
grande mestre-artesão, “fazedor” de Santos, o “Chico Santeiro”. Escultor de reconhecida habilidade. O mestre Santeiro transformava a madeira em perfeitos “tipos” nordestinos. Utilizou sua arte para esculpir pequenas imagens de santos e cristos crucificados.
Diferente do comum, aqueles apelidados de Chico, o nome de Chico Santeiro é Joaquim Manoel de Oliveira, natural do município de Santo Antônio do Salto da Onça. Herdou do pai o gosto da escultura em madeira. Existem peças de Chico Santeiro em diversos lugares, inclusive no Vaticano. Hoje a arte de Chico Santeiro resiste através das mãos do seu genro, Zé Santeiro.
Popularidade
A princípio, Chico Santeiro esculpia apenas imagens de santos, com um simples canivete, - a base fundamentá, como diz ele, - aperfeiçoando a técnica que aprendera do velho pai, também imaginário. Depois, ampliou o campo de sua arte, passando a modelar figuras de cangaceiros, rendeiras, tipos de rua, carros-de-bois.
Hoje, poucas pessoas de bom gosto transitam por Natal sem levar alguma peça de Chico Santeiro. Não há melhor "souvenir" daquela cidade do que um Lampeão ou um Crucifixo de Chico.
De sua popularidade, diz bem este fato: Certa manhã, visitando a bonita residência do Dr. Aben Athar Netto, na Ilha do Governador, sentimos a alegria com que aquele intelectual se referia à sua coleção de arte popular de todo o Brasil. Indagando se tinha algo do Rio Grande do Norte, incontinenti ele abriu uma estante e nos apresentou uma estatueta de Chico Santeiro.
Chico está em todas. E está porque não fez apenas de sua atividade de escultor o seu ganha-pão. Ele põe também um certo que, um sabor de coisa nordestina às figuras e bichos que cria com tanta graça. É um artista. Rude, mas autêntico.
Os que sabem que a distinção entre o artista erudito e o popular reside apenas na diferença de cultura dos seus autores, - “tanto no sentido de nível de instrução e riqueza de conhecimentos, quanto na acepção que abrange aspectos da vivência individual e coletiva”, como ensinava Aires da Mata Machado Filho, - ainda mais valorizam o trabalho do escultor popular.
Precisando fixar alguns traços da vida e arte do Santeiro, para este Catálogo, preferimos conversar com ele, à vontade. Pobre, de vida sofrida, pouco tem o que contar. Grande é só a alma. A que está no sorriso aberto e franco de todos os dias. Na humildade de sua condição humana. No otimismo das expressões que sabe imprimir às fisionomias tanto dos Cristos quanto dos Lampeões que esculpe e espalha por todo o Brasil.
O imaginário Manoel Francisco Xavier casou-se três vezes. Chico é filho único da segunda mulher, Idalina Maria da Conceição. Um irmão, por parte de pai, também se destacou como artista: João Imaginário, como era conhecido, e que viveu muitos anos em Rigo-Muleiro, no Rio Grande do Norte. Dos tios, dois são ainda imaginários: Tico Baquara, que mora em Sapé da Paraíba, grande artista da madeira, - nos informa Chico; e uma mulher, Rosa Baquara, moradora em Araçá, que também trabalha em santo.
Chico, - seu verdadeiro nome é Joaquim Manoel de Oliveira, nasceu na propriedade Tinguijada, município de Santo Antonio do Salto da Onça, (Rio Grande do Norte), a 8 de junho de 1898.
A primeira escultura
Conta-nos que, com a idade de dez anos, talhou a sua primeira escultura de madeira. Era um São João, pintado, "piquininim". O velho Francisco Xavier estava em viagem e Chico o acompanhou. Fez o santinho para vender pelo caminho.
Chegando a Coité de Chica Gorda, na beira do rio Manguape, (Mamanguape), - como ele dizia, - hospedou-se numa casa, onde o pai esteve endireitando uns santos. A dona da casa tinha um cachorrinho muito bonito e Chico ficou logo encantado pelo animal. Sem o velho saber, Chico propôs a troca do santo pelo cachorrinho. A mulher aceitou e Chico ficou feliz. Mas, como o que é bom dura pouco, apareceu depois um sujeito que veio buscar o cachorrinho. A mulher explicou que tinha trocado o animal por uma escultura. Todavia, o desgraçado não quis conversa e atirou de espingarda no cachorrinho, que estava sentado no terreiro, matando-o.
Imaginem a tristeza de Chico! Deram-lhe ainda, a título de consolação, cinco mil réis.
Mais tarde, encontrando o pai, contou toda a história. O velho disse que aquilo deveria servir de lição para ele, sentenciando:
- Não é negócio se trocar santo por cachorro!
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De Santeiro a escultor popular
Podemos dizer que foi o escritor Luís da Câmara Cascudo quem descobriu Chico Santeiro em Natal. Todavia, a primeiro escultura profana que fez naquela cidade foi a pedido do prof. Protásio Melo.
- Um retrato do nêgo véio Fabião das Queimadas.
Protásio mostrou-lhe um desenho do cantador, de autoria do prof. Hostílio Dantas, e indagou se ele seria capaz de fazer um em madeira. Chico topou a parada e desde esse dia começou a fazer outras peças. Faz vinte anos que trabalha talhando peças de Lampeão, Maria Bonita, Padre Cícero, Antonio Conselheiro, etc. Falamos do Crucifixo que enviou ao Papa Pio XII, por intermédio do Dr. Paulo Pinheiro de Viveiros, tendo recebido bênção especial, que ainda conserva emoldurada em sua casa. Outras pessoas importantes têm peças de sua autoria, como D. Helder Câmara e o ex-presidente Juscelino Kubitschek.
Irene e José
Em 1932, casou-se em Goianinha (R. G. N.), com Maria Felix de Oliveira, (papa-muçu, como ele chama, debochando). O casal teve nove filhos, dos quais sobrevivem seis.
Um dos seus garotos, Antonio, já está ensaiando umas pecinhas. Mostrou-nos um Lampeãozinho de duas polegadas, ainda sem carta definida, mas de muito boas proporções.
Todavia, quem o ajuda desde muitos anos é a sua filha mais velha, Irene, casada com José Bezerra da Silva. Este seu genro faz três anos que também trabalha na arte. Começou lixando peças. Hoje, com a orientação do Santeiro e da esposa, já é senhor de muitos segredos da arte . Os seus carros-de-bois não têm diferença daqueles do Santeiro. Apenas, - ele próprio nos confessa, - não consegue ainda fazer crucifixos e nem Lampeões. Irene, ao contrário, faz todas as peças que o pai imagina.
O instrumental
Chico Santeiro nos diz que trabalha com qualquer espécie de madeira. Todavia, as melhores são Imburana, (a de cheiro é a mais clara), Cedro, Cajá e Imbúia. Informou-nos que vai buscar a madeira, para as esculturas, lá prás bandas de Angicos, Queimada, Serra da Jandaia.
Perguntamos qual o instrumental que utiliza em seu trabalho, ao que nos respondeu:
- O canivete é a base fundamentá. Além disso, usamos o serrote, enchó, formão, furador, compasso, plana, esquadro, cola, prego e uma serrinha, prá fazer cabelo, barba e bigode.
Chico adiantou-nos que, das peças que tem feito até hoje, as que gosta mais de talhar são os crucifixos e cangaceiros.
Para ele, - nos disse, - não há nada difícil de fazer. A não ser o que não conhece. Tipos estranhos, por exemplo.
- Aí, tenho que estudar e precisa tempo.
Atendendo pedidos extravagantes, já tem feito estatuetas de Bertôve (Beethoven), Castro Arves (Alves), Buda e outros. Ele, porém, é tão autêntico, que sempre consegue dar um ar de nordestino a essas figuras exóticas...
Além das esculturas, faz também trabalhos em alto relevo, em madeira. Já trabalhou com barro e gosta muito de pedra sabão.
A princípio vendia peças a vinte, vinte e cinco mil réis. Hoje, o preço é de duzentos, duzentos e cinquenta cruzeiros por cada peça. Os carros-de-bois são vendidos a seiscentos.
Indagamos se a freguesia era constante, ao que nos contestou:
- Ficam até com raiva de mim, quando não tenho nada em casa.
Joaquim Manoel de Oliveira (Chico Santeiro) nasceu em 8 de junho de 1898 e faleceu em 1º de fevereiro de 1966.